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Violência sexual infantil gera consequências desastrosas

 A maioria dos casos acontece em ambiente familiar

O dia 18 de maio é instituído como o “Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes”. A data marca um violento crime ocorrido, em 1973, contra Araceli, uma criança de oito anos de idade que foi sequestrada, estuprada e assassinada por membros de uma família do Espírito do Santo. Infelizmente, a história de Araceli não é apenas um caso bárbaro ocorrido contra crianças e adolescentes vítimas de tamanha violência, mas o retrato do que acontece em muitos lares brasileiros e baianos. O mais chocante é que a maioria dos crimes que violam a dignidade infantojuvenil acontece dentro do ambiente familiar e são praticados, muitas vezes, por parentes da vítima. Como uma das formas de chamar a atenção da sociedade e coibir este tipo de prática, o Ministério Público estadual lançará no próximo dia 18, a campanha “Existem Fantasmas que não vão embora com a infância”, durante o Seminário sobre a temática.  O objetivo é conclamar a sociedade a denunciar a violência sexual infantil por meio do “Disque 100”. O evento acontece a partir das 8h30, na sede do MP, em Nazaré, Salvador.

Dados do Disque Denúncia, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, apontam que na Bahia, no ano de 2016, foram contabilizados 1.187 denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes, sendo 354 em Salvador. O número de abusos sexuais foi de 989 e de exploração sexual chegou a 258. No ano anterior, foram 1.329 denúncias, sendo 372 em Salvador. Deste total, 515 casos ocorreram na casa da vítima. O número de abuso sexual em 2015 chegou a 1.123 e de exploração sexual a 293.

É considerado abuso toda violência sexual praticada por um adulto ou alguém mais velho com o objetivo de satisfação sexual, deixando prevalecer o poder ou autoridade sobre a criança. Já a exploração sexual é caracterizada pela obtenção de lucro, troca ou vantagem, a exemplo de prostituição, pornografia, tráfico e turismo sexual. A violência pode acontecer em ambiente extra ou intra familiar. A extra familiar é aquela em que o autor não tem vínculo com a família e a intrafamiliar praticada por pais ou responsáveis por proteger as crianças e os adolescentes. De acordo com a procuradora de Justiça Márcia Guedes, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Criança e do Adolescente do MP (CAOCA), “a violência sexual é uma das piores formas de violação à dignidade do ser humano. Se no adulto ela deixa marcas para o resto da vida, imagine para uma criança em fase de desenvolvimento de sua personalidade e formação do seu próprio corpo”.

A psicanalista Solange Meinking, que capacita conselheiros tutelares, por meio da Fundação César Montes (Fundacem), afirma que os impactos causados nas vítimas de violência sexual na fase adulta são desastrosos. “As marcas deixadas são muito profundas e podem gerar diversos conflitos, como Transtornos Obsessivos Compulsivos (TOC), perturbações mentais, depressão, somatizações no corpo, doenças de pele e até mesmo o suicídio. E a violação sendo causada por aqueles que deveriam  cuidar dessa criança ou adolescente é ainda mais degradante”. Solange destaca ainda a importância dos responsáveis ficarem atentos a qualquer mudança de comportamento da criança e investigarem profundamente o motivo, a fim de romper qualquer ato violento.

Sinais da violência

Os sinais da violência sexual podem ser apresentados de diversas formas, como baixo rendimento escolar (isolamento, brigas com colegas); curiosidade sexual excessiva; condutas antissociais, como agressividade e hostilidade; ansiedade e medos; comportamentos autodestrutivos; distúrbios alimentares ou do sono; doenças sexualmente transmissíveis; entre outros.  A procuradora Márcia Guedes registra a necessidade dos profissionais de educação também ficarem atentos. “Quando, por exemplo, uma criança é ameaçada, ela vai para a escola e pode ficar recolhida em um canto, sem interagir com outros colegas. Como os professores, muitas vezes, passam mais tempo com a criança do que a própria família, eles têm a percepção com mais facilidade e podem contribuir ao denunciar,  a fim de que tomemos as providências cabíveis”.

Medidas adotadas pelo Ministério Público

Ao tomar conhecimento da denúncia, o MP instaura procedimento administrativo para ouvir o denunciante e, a depender do caso, já pode adotar medidas protetivas. O órgão oficia imediatamente o Conselho Tutelar e a Delegacia Especial de Crime contra a Criança e o Adolescente (Derca) para investigarem o caso. “Os promotores de Justiça que atuam na área da infância buscam medidas de proteção com base no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), podendo  resultar, inclusive, na retirada do agressor do lar. Se a violência é praticada por um dos pais com a conivência do outro, ambos podem vir a ter suspenso ou perder o poder familiar, sem prejuízo de outros procedimentos adotados pelo Conselho Tutelar e pelos promotores de Justiça da esfera criminal”, pontuou Márcia Guedes.

Este ano, foi sancionada a Lei 13.431/17, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência. Entre outros aspectos, a Lei disciplina a escuta especializada perante o órgão da rede de proteção e o depoimento especial junto à autoridade policial ou judicial, além de implementação de políticas públicas nos sistemas de justiça, segurança pública, assistência social, educação e saúde. As ações deverão ser  adotadas de forma articulada e visam acolher e atender integralmente as vítimas. Em setembro do ano passado, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprovou a Recomendação nº 43 para acelerar as investigações, denúncias e o acompanhamento de ações penais pela prática dos crimes de abuso e exploração sexual, tortura, maus tratos e tráfico de criança e adolescente. A Recomendação considerou, entre outros aspectos, a necessidade de aperfeiçoar o sistema de atendimento e apuração das denúncias com mais celeridade. A Lei Maria da Penha também pode ser aplicada em casos de violência de gênero, quando meninas são violentadas, segundo afirmou a promotora de Justiça Ana Bernadete Melo de Andrade.

O MP conta ainda com o Serviço de Apoio Psicossocial, composto por assistentes sociais, psicólogos e pedagogos. “Além da importância da denúncia e da aplicação das medidas judiciais, é preciso dialogar, acolher e tratar a vítima de violência no aspecto psicológico”, enfatizou Ana Bernadete Andrade.

Denuncie

Em caso de suspeita ou notícia de crime contra criança ou adolescente qualquer pessoa pode procurar o Conselho Tutelar da sua cidade; ligar para Disque 180 e Disque 100, canal gratuito e anônimo; além de procurar as delegacias comuns e  especializadas; a Polícia Federal para crimes internacionais e interestaduais e a Polícia Rodoviária Federal para crimes nas rodovias federais.