fbpx

Nordestinas e negras: grupo mais vulnerável a violência contra a mulher

Mulheres nordestinas negras estão entre grupos mais vulneráveis a violência e pobreza, alerta ONU

 

Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo. Foto: EBC/Marcello Casal Jr.

 

Cerca de 75% da população do Nordeste do Brasil é negra. Na região, 43,4% das pessoas estão em situação de pobreza, e 13% têm renda inferior a dois dólares por dia. Desigualdades foram tema das rodas de diálogo “Mulheres Negras Rumo a um Planeta 50-50: O que queremos em 2030?”, organizadas pela Rede de Mulheres Negras do Nordeste com o apoio da ONU Mulheres e do Comitê Mulheres Negras Rumo a um Planeta 50-50 em 2030. Encontros aconteceram em Salvador, Maceió e Recife entre 5 e 15 de dezembro.

 

“Os estudos estão revelando um quadro mais preciso da vulnerabilidade e dimensionam a violação de direitos das mulheres negras. Isso chama à urgência de medidas concretas para colocar as mulheres negras no centro das prioridades políticas, dos investimentos públicos e das ações para a eliminação do racismo e das desigualdades de gênero”, defendeu a representante do organismo das Nações Unidas no Brasil, Nadine Gasman.

 

“Não há desenvolvimento possível para o Brasil enquanto as mulheres negras continuarem como grupo que tem ficado para trás no acesso a direitos, condições decentes de sobrevivência e tomada de decisão”, acrescentou a especialista.

 

Dois levantamentos recentes detalham a situação de vulnerabilidade das mulheres negras nordestinas. De acordo com o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência, a possibilidade de uma mulher negra nordestina, entre 15 e 29 anos, ser vítima de assassinato é quatro vezes maior em relação às brancas – quase o dobro da média nacional. No Rio Grande do Norte, elas têm oito vezes mais chances de ser vítimas fatais da violência.

 

Já a pesquisa Condições Socioeconômicas e Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher aponta que, entre as mulheres nordestinas que sofrem agressões físicas durante alguma gestação ao longo da vida, 77% são mulheres negras. Além disso, 24% das mulheres negras testemunharam ou perceberam a ocorrência de violência doméstica contra as suas mães, enquanto a mesma situação foi vivenciada por 19% das mulheres brancas no Nordeste.

 

Os objetivos da ONU e as mulheres negras

 

As rodas de diálogo “Mulheres Negras Rumo a um Planeta 50-50: O que queremos em 2030?” iniciam um processo de mobilização das mulheres negras tendo em vista a implementação a nível local dos objetivos globais das Nações Unidas.

 

“A partir da roda de diálogo, estamos reforçando as nossas estratégias de incidência e reafirmamos que não é possível pensar em desenvolvimento com a morte cotidiana de jovens negros, mulheres negras e homens negros”, considera Valdecir Nascimento, coordenadora executiva da Articulação de ONGs de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB) e integrante do Comitê Mulheres Negras Rumo a um Planeta 50-50 em 2030, vinculado à ONU Mulheres Brasil.

 

“O grupo está focado em produzir conceitos capazes de colocar as mulheres negras no centro do debate”, completou Valdecir, que também responde pela coordenação do Instituto Odara, responsável pela realização das conversas em Salvador.

 

Em Maceió, o encontro ocorreu no dia 6 e reuniu representantes de entidades sindicais, de comunidades de terreiro, de instituições acadêmicas, do governo municipal, militantes da área da educação e saúde e jovens comunicadoras. “Ainda que os ODS (os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU) sejam uma agenda global, tudo acontece no município. Então, é preciso provocá-los”, destacou Vanda Menezes, da Rede de Mulheres Negras do Nordeste.

 

A ativista conta que outro encontro está agendado para janeiro de 2018, quando as participantes definirão uma “estratégia local para mulheres negras, conectada aos ODS e à Década Internacional de Afrodescendentes para ser apresentada ao município”.

 

Em Recife, o evento também debateu a relação entre as metas das Nações Unidas e a realidade vivida pela população brasileira. Segundo Mônica Oliveira, integrante da Rede de Mulheres do Nordeste e do Grupo de Apoio da Sociedade Civil da ONU Mulheres (GASC), um dos desafios é “tornar os ODS mais próximos ao cotidiano das mulheres negras”. Os coletivos e organismos interessados da capital pernambucana também se reunirão em janeiro, para ampliar a mobilização contra a discriminação racial, a violência de gênero e as desigualdades.

 

Histórico de apoio 

 

A ONU Mulheres foi uma das apoiadoras da Marcha das Mulheres Negras ocorrida em 2015. Na ocasião, a secretária-geral adjunta das Nações Unidas e diretora-executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka, fez um chamado contra o preconceito e suas consequências. “A luta de vocês é a nossa luta. E a luta da ONU Mulheres é a luta de vocês.

 

Estamos aqui, no Brasil, para dizer que temos de pôr fim à violência contra as mulheres. Também estamos aqui para dizer fim ao racismo. Vamos em frente com o bem-viver”, declarou.

Passados dois anos, a ONU Mulheres desenvolve a estratégia de comunicação e conscientização política Mulheres Negras Rumo a um Planeta 50-50 em 2030. Objetivo da iniciativa é promover a adoção de uma perspectiva de gênero e raça pelas agendas governamental e intergovernamental e pela opinião pública.

 

“A ONU Mulheres está articulando ações para colocar as mulheres negras no centro da mobilização pelo desenvolvimento sustentável no Brasil e posicionando-as como agentes e público fundamentais para alcançar um Planeta 50-50, com paridade de gênero, avançando na eliminação do racismo, como estabelece a Década Internacional de Afrodescendentes. O nosso trabalho é inserir as mulheres em situação de maior vulnerabilidade, entre as quais se encontram as mulheres negras, nas principais agendas das Nações Unidas. Isso precisa ser feito o tempo todo para um processo de transformação inclusivo diário e que tenha efeitos robustos até 2030”, completa Nadine.