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Afinal: quem mandou não estudar?

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 Photo by Valentin B. Kremer on Unsplash

* Por Nilson Lattari

Chamou-me a atenção uma transeunte reclamando de um jovem que estava desempregado, e reclamando, a expressão: Quem mandou não estudar? De fato, me perguntei depois: Afinal? Quem mandou ele não estudar?

Talvez tenha faltado alguém acordá-lo, pela manhã, e dizer: Filho, você vai se atrasar para a escola! Vamos, vamos, para de enrolação e vamos sair dessa cama e já para a escola! Ou talvez: Filho, aqui está sua merenda ou o dinheiro da merenda, e o dinheiro da passagem. Ou então: Sua roupa está limpa esperando, vai para a escola ou seu pai vai conversar com você hoje à noite?

Se de fato tivesse tudo isso não haveria desculpas. Afinal! Alguém mandou ele estudar e se preocupou com isso.

Mas, voltando à observação: Alguém mandou ele não estudar? Talvez o pai, que precisa cuidar da terra e não tem mais ninguém, e na falta da colheita não haverá comida na mesa, tenha dito: Preciso de você aqui, escola não dá, estudar para quê? Ou a mãe que precisa de um filho para tomar conta dos menores, e não dê importância a mandar estudar. Muitas coisas mandam alguém não estudar: a fome, a falta da família, a própria condição social, e, no pior dos mundos: Não vou ser nada mesmo, para que estudar?

As forças para o desestímulo e ir estudar são muitas. A escola de péssima qualidade, a merenda fraudada que poderia ser bem melhor, a competição desigual com aqueles que têm melhores condições, o professor mal pago, muitas coisas mandam alguém não estudar, e alguém que os mande estudar.

Da mesma forma que ver uma jovem com um filho no colo e dizer quem mandou transar, e, na mesma hora, se constrói uma história destrutiva para ela, porque é mais confortável aceitar a realidade própria do que tentar entender a real realidade, dizer “quem mandou não estudar” é ignorar a história do outro. A negação é a zona de conforto do alienado e do meritocrata.

Caberia a pergunta para aqueles que gostam de questionar: E se ninguém tivesse mandado você estudar? Você teria?

Nilson Lattari, é graduado em Literatura pela UERJ e especialização em Estudos Literários pela UFJF. Fui primeiro colocado em crônicas no Prêmio UFF de Literatura, 2011 e 2014, e terceiro colocado em contos pelo mesmo prêmio em 2009. Primeiro colocado em crônicas prêmio Darcy Ribeiro – Ribeirão Preto, 2014. Finalista em livro de contos Prêmio SESC de Literatura 2013, finalista em romance Prêmio Rio de Literatura, 2016, além de várias menções honrosas em contos, crônicas e poesias.