Afranio Peixoto em Audiência Pública na Câmara
Em audiência pública, funcionários do Afrânio Peixoto denunciam precarização
A Câmara Municipal de Vitória da Conquista (CMVC) realizou na noite dessa segunda, 17, uma audiência pública sobre saúde mental e a situação do Hospital Especializado Afrânio Peixoto. A audiência foi proposta pelo mandato do presidente Gilzete Moreira (PSD), uma forma de estabelecer um espaço de debate sobre saúde mental no Legislativo.
O evento contou com a participação de representantes do Afrânio Peixoto, Ministério Público, Prefeitura Municipal, Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Estado da Bahia (Sindsaúde-Ba) e da ONG SEM CID. O debate gravitou sobre a situação do Afrânio e seu possível fechamento diante do processo de precarização pelo qual a unidade vem passando, segundo relato de profissionais.
“Unidade hospitalar tem dia e hora para encerrar suas atividades” – O técnico em enfermagem e membro do Hospital Especializado Afrânio Peixoto, Fabrício Santana, informou que o Afrânio atende às regiões sudoeste, oeste e sul da Bahia, além do norte de Minas Gerais, presta atendimento ambulatorial a cerca de 4.800 usuários e dispõe de 20 leitos para internação de pacientes em surto. O técnico denunciou que o hospital, nos últimos anos, vem sofrendo um processo de precarização como a redução no número de funcionários e o sucateamento do espaço físico. Segundo ele, o Governo Estadual está descumprindo às leis 8080/1990, que regulamenta o SUS, e 10.2016/2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais. E sentencia: “A repercussão que essa precarização em curso denota aos trabalhadores, à comunidade, inclusive à comunidade acadêmica, é de que a referida unidade hospitalar tem dia e hora para encerrar suas atividades, como já se escuta pela cidade”.
50 anos de existência e nenhuma reforma – A diretora geral do Hospital Afrânio Peixoto, Lygia Matos, destacou que a unidade tem enfrentado algumas dificuldades no atendimento ao público. Ela apontou que a estrutura física tem 50 anos e jamais passou por uma reforma que não fosse a pintura das paredes e pequenos reparos. “Tem problemas estruturais graves, sérios”, apontou Matos.
Com 30 leitos cadastrados, apenas 22 estão atendendo à população por falta de material humano e hospitalar. Segundo ela, mais de 25% dos leitos estão paralisados. “Nós temos 30 leitos cadastrados, mas só temos 28 camas e apenas 22 leitos funcionando”, detalhou. Além dos leitos inativos, o hospital não está atendendo casos de urgência e emergência durante a noite e nos finais de semana.
SUS vem atravessando uma séria crise na Bahia – A diretora Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Estado da Bahia (Sindsaúde-Ba), Mariene Brito Exaltação Ribeiro, lembrou que o Afrânio existe há 50 anos. A sindicalista afirmou que o SUS vem atravessando uma séria crise na Bahia decorrente de problemas nacionais e também da gestão do sistema pelo Governo Estadual. “Ausência de concurso público e a política de privatização implantada pela SESAB têm precarizado os serviços e desvalorizando os trabalhadores que já sofrem com baixa remuneração, corte de insalubridade e falta de incentivos”, afirmou. Sobre o Afrânio, ela pontuou: “Quero salientar que o déficit de trabalhadores é muito grande. Se alguém entrar de férias, licença prêmio ou atestado médico, há dificuldade de trabalhador para cobrir essa lacuna, precisando fazer remanejamento ou ficar devendo horas para o servidor”.
Pessoas com problemas mentais são marginalizadas – A representante do SEM CID, Elisa Guimarães, explicou que se trata de uma associação de pessoas que passam por tratamento psiquiátrico. Ela apontou que as pessoas se sentem amedrontadas pela possibilidade do Afrânio Peixoto ser fechado pelo Governo do Estado. “O boato de que o Afrânio será fechado é assustador”, disse. Elisa cobrou a manutenção do hospital e a ampliação do número de leitos disponibilizados para atendimento à população. A representante da associação disse também que ainda hoje existe uma marginalização das pessoas com problemas mentais, sofrem ainda quando, ao necessitarem de atendimento do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU 192) a ambulância chega acompanhada por uma viatura da Polícia Militar.
Afrânio Peixoto tem atendimento diferencial – A residente no Afrânio, Maria Elisa, que representou a médica e coordenadora do hospital, Lívia Pires Vasconcelos, reafirmou a importância da instituição. Ela lembrou que outras unidades hospitalares do município não possuem estrutura para atender pacientes com transtorno mental. Segundo a profissional, muitos desses pacientes chegam ao Afrânio em situação bastante grave, em muitos casos, oferecendo risco a ele próprio e a outras pessoas.
Futuro incerto – O funcionário público e psicólogo Átila Patéz destacou a importância da discussão sobre o futuro do atendimento às pessoas com problemas mentais em Conquista com a possibilidade do encerramento das atividades do Hospital Afrânio Peixoto. “Nós não temos ainda uma Atenção Básica preparada para os casos leves”, disse Patéz, destacando a importância da unidade hospitalar para o atendimento de pessoas com deficiência mental. Patéz destacou que a aprovação da PEC 241 dificulta ações que buscam a otimização do serviço de saúde na cidade, inclusive aquelas que tem como alvo as pessoas com deficiência mental.
Situação pode piorar com aprovação da PEC 241 – O presidente do Sindsaúde-Ba, Roberto dos Anjos e Silva, lamentou que pouco se andou em políticas públicas e investimentos em saúde mental na Bahia. Ele propôs a realização de um seminário para expandir a discussão, sobretudo porque o tema da saúde mental não tem sido discutido. O sindicalista alerta que as ameaças de fechamento de hospitais como o Afrânio vêm ocorrendo, mesmo que veladas. Silva também frisou que a situação pode piorar caso a PEC 241, emenda que limita os gastos do governo, seja aprovada pelo Congresso Nacional. Críticos da PEC apontam que áreas prioritárias como saúde e educação sofreram grandes cortes orçamentários.
Descaso, Estado não envia representante – A promotora do Ministério Público da Bahia, Guiomar Miranda, lembrou que a Lei Antimanicomial prevê a inclusão das pessoas com deficiência mental, inclusive nos hospitais de base. “Ela teve origem num processo de estudos que vivenciou verdadeiros maus tratos, situações de verdadeiro abandono, de esquecimento do ser humano”, disse. A promotora explicou que em janeiro de 2014 foi informada sobre a intenção do Governo do Estado transformar o Hospital Afrânio Peixoto num Hospital Clínico com leitos psiquiátricos. “Pelo menos é o que o Governo do Estado informou a essa promotora de justiça quando fiz demandas e uma recomendação ao governador Wagner em relação à superlotação do Hospital Geral de Vitória da Conquista”, afirmou. Ela lamentou o que considera desinteresse do Governo do Estado. “O descaso está demonstrado aqui. Sequer foi encaminhado um representante do Governo do Estado”, apontou a promotora.