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Casamento x união estável

 

Nos últimos tempos, muito se tem ouvido falar da União Estável desde que o termo concubinato, amaziados, entre outros, começou a cair em desuso.

A união prolongada entre homem e a mulher, sem casamento, foi vista durante longo período de forma preconceituosa, uma vez que a história do nosso País nos ensina que possuímos ascendentes extremamente religiosos e conservadores que não reconheciam tais relacionamentos sem a presença de toda a formalidade exigida por lei.

O Código Civil de 1916 continha alguns dispositivos que faziam restrições a esse modo de convivência, proibindo, por exemplo, doações ou benefícios testamentários do homem casado à concubina, ou a inclusão desta como beneficiária de contrato de seguro de vida. O grande passo, no entanto, foi dado pela atual Constituição Federal, ao proclamar, no artigo 226, parágrafo 3º:

“ Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.

A partir daí a relação familiar nascida fora do casamento passou a denominar-se união estável, ganhando novo status dentro do nosso ordenamento jurídico. Começando pela legislação previdenciária alguns direitos do companheiro ou companheira foram sendo reconhecidos, tendo a jurisprudência admitido outros, como o direito à meação dos bens adquiridos pelo esforço comum. A medida em que a união estável começou a ser amplamente aceita pela sociedade, o Judiciário brasileiro passou a compreender que em que pese o grande formalismo que o Código Civil atribui ao casamento, certos direitos, principalmente os ligados ao regime de bens, deveriam ser analisados com cautela, sob o aspecto do “esforço comum” durante os anos de relacionamento, o que acabou gerando a Súmula 380 do STF “comprovada a existência da sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”.

Recentemente, houve uma decisão da 3ª Câmara do Tribunal de Justiça do Maranhão, que reconheceu como união estável o relacionamento de uma mulher que ingressou na Justiça pleiteando direitos patrimoniais após o falecimento de um homem casado com outra pessoa e com quem manteve um relacionamento paralelo por 17 anos. Ainda de acordo com o Magistrado

“entre as novas formas de famílias hoje existentes despontam-se as famílias paralelas. Se a lei lhes nega proteção, a Justiça não pode ficar alheia aos seus clamores. O enunciado normativo não encerra, em si, a Justiça que se busca. Não se pode deixar ao desamparo uma família que se forma ao longo de muitos anos, principalmente existindo filhos”

Mas, embora a decisão pareça ser totalmente inovadora, deve ser levado em consideração que no caso em tela, já existia a separação de fato, conforme ponderou o Desembargador

“A separação de fato se apresenta como conditio sine qua non (condição indispensável) para o reconhecimento de união estável de pessoa casada. Entretanto, a força dos fatos surge como situações novas que reclamam acolhida jurídica para não ficarem no limbo da exclusão. Entre esses casos, estão as famílias paralelas que vicejam ao lado das famílias matrimonializadas”.

Uma das características da união estável é a ausência de formalismo para a suaconstituição. Enquanto o casamento é procedido de um processo de habilitação, com publicação dos proclamas e de inúmeras outras formalidades, a união estável, ao contrário, independe de qualquer solenidade, bastando o fato da vida em comum. Ao contrário do que é amplamente divulgado pelo senso comum, o Código Civil de 2002não exige período de convivência mínima para ser caracterizada união, os requisitos mais importantes são a convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. No campo pessoal, a lei reitera os deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos como obrigação recíproca dos conviventes. Em face da equiparação do referido instituto ao casamento, aplicam-se lhe os mesmos princípios e normas atinentes a alimentos entre cônjuges. Em relação aos efeitos patrimoniais, o regime é o da comunhão parcial de bens, salvo contrato escrito entre os companheiros (art. 1725).

É importante lembrar, que embora a união possa parecer mais vantajosa por não exigir tantos procedimentos para sua constituição, quando de sua dissolução pode virar uma dor de cabeça em decorrência das provas e por falta de documento constitutivo da ent. Idade familiar. A relação havida entre esposa e o marido é facilmente reconhecida, o de conviventes é mais trabalhoso. Portanto, embora não seja obrigatório é altamente recomendável que seja formalizado a constituição de união estável por meio de um contrato de convivência entre as partes, que servirá como marco de sua existência, além de propiciar a regulamentação do regime de bens.

Outro ponto importante, é em relação a sucessão hereditária. O Código Civil de 2002, preserva a meação, que não se confunde com herança, do companheiro, sobrevivente, em razão do regime da comunhão parcial de bens, nos termos do artigo1725 do aludido diploma. No tocante à herança, os direitos sucessórios limitam-se “aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável”. Tais direitos sucessórios são, todavia, restritos a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho, se concorrer com filhos comuns, ou à metade do que couber a cada um dos descendentes exclusivos do autor da herança, se somente com eles concorrer, ou a um terço daqueles bens se concorrer com outros parentes sucessíveis, como ascendentes, irmãos, sobrinhos, tios e primos do de cujus, ou à totalidade da herança, não havendo parentes sucessíveis (art. 1790, I a IV, CC). Desta forma, a legislação vigente restringe o direito hereditário aos bens adquiridos na constância da união estável e ainda coloca o companheiro para concorrer com os descendentes, ascendentes e colaterais até o quarto grau. Um verdadeiro retrocesso em relação a Lei n. 8.971/94, quando o companheiro recebia toda a herança caso não houvesse descendente ou ascendente, que inclusive, é o que ocorre no caso do cônjuge.

Sendo assim, o casamento continua absoluto como a melhor forma de constituir família, em função do indiscutível reconhecimento jurídico. Não há duvidas sobre os direitos dos cônjuges, nem a existência do casamento que facilmente é comprovado com a certidão de casamento. Já na união estável que se parece com o casamento, mas não é, alguns empecilhos e dificuldades podem ser encontradas no dia a dia e, como vimos acima, principalmente em relação aos direitos sucessórios. Caso você esteja vivendo sob o regime da união estável, o mais recomendado é que busque um cartório e firme em documento tal situação. Segurança jurídica nunca é demais e levando-se em consideração a grande burocracia e o nível de rigor e formalismo que há no judiciário, um simples papel pode economizar muita dor de cabeça. O restante, na prática, não traz muitas dificuldades e não impede o casal de agir como se casados fossem, sendo dependentes em imposto de renda, INSS, planos de saúde e seguro de vida, tornando a escolha entre casamento ou apenas morar junto, mais uma questão pessoal relacionado ao que cada um acredita e busca em sua vida, do que uma decisão tomada em decorrência de cobranças da sociedade.

Por Danielle Menezes, sócia do escritório Andrade & Menezes Advocacia. Advogada formada pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, cursando o último semestre de pós graduação em Direito Imobiliário pela mesma instituição.