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Guia de combate à corrupção nas prefeituras brasileiras

Esse trabalho é especialmente desenvolvido entre voluntários de diversas profissões. O alcance da iniciativa deve ser inclusive dos escritórios de contabilidade, escritórios de advocacias que prestam serviços para as prefeituras, corroborando para disseminar o terrível mal que assola nosso país. Não importa o tamanho do município, nem a população. O que importe é que nele tenham pessoas comprometidas com a verdade, com o direito e a honestidade.

 

Sociedade civil se organiza em defesa do dinheiro público combatendo a corrupção

 A Associação Amigos de Ribeirão Bonito, interior de São Paulo –  AMARRIBO, nasceu em 1999 de uma reunião de amigos nascidos, residentes ou simpatizantes de Ribeirão Bonito, interessados em oferecer voluntariamente seu tempo, talento, competências e habilidades para contribuir para o desenvolvimento da cidade.

Ao tentar empreender projetos de interesse social, a organização se deparou com grande descaso por parte da administração pública e com indícios fortes de desvio de recursos públicos. Diversas denúncias começaram a chegar a sede da Amarribo em 2000. Sua equipe decidiu então dedicar-se ao combate à corrupção na cidade, pois com o cenário presente a época, nenhum projeto social iria conseguir prosperar. Com as provas coletadas a organização efetuou denúncias junto à Câmara Municipal e a Promotoria de Justiça da cidade e ao Tribunal de Contas do Estado.

Para promover o afastamento dos corruptos a Amarribo mobilizou a sociedade, realizou audiências públicas, desenvolveu diversos meios de comunicação com a população, e conseguiu afastar diversos políticos da cidade, e processar outros que já haviam deixado o poder. Essa mobilização foi fundamental e garantiu a cassação de 2 prefeitos e 5 vereadores em Ribeirão Bonito.

O caso de Ribeirão Bonito teve repercussão nacional e diversos cidadãos do país procuraram a organização em busca de apoio e orientação para formarem ONGs com o mesmo objetivo em seus municípios. A partir de então a Amarribo iniciou um trabalho de disseminação de sua experiência, e lançou o livro “O Combate à Corrupção nas Prefeituras do Brasil” com sua história e ferramentas para o controle social.

Em 2003 começaram a surgir as primeiras organizações inspiradas na Amarribo e se formava a Rede AMARRIBO Brasil – IFC. Hoje são mais de 200 organizações que integram esta Rede, coordenada pela Amarribo em parceria com o Instituto de Fiscalização e Controle – IFC. Palestras, oficinas e formações são realizadas por todo o país.

Em 2011 a organização passou a ser Amarribo Brasil, ampliando sua atuação para nível internacional e atualmente a Amarribo é a organização de contato da Transparência Internacional no Brasil.

Certamente, a corrupção é um dos grandes males que afetam a sociedade brasileira, especialmente a administração pública. Nossa história mostra que as práticas ilícitas do desvio de recursos, do favorecimento de amigos e parentes e da troca de favores têm nos condenado a um estado de subdesenvolvimento crônico.

Tão grave quanto a própria corrupção é a naturalização dos comportamentos anti-éticos que são traduzidos em ditos populares como “rouba, mas faz”. O bom uso da máquina pública não deve ser vista como uma cortesia, mas como uma obrigação do governante eleito.Viver em sociedade significa pensar no coletivo acima de seus próprios interesses.

Se o cidadão paga imposto e aceita a legislação vigente em nome do bem-estar social, é imprescindível que o administrador público também o faça. O descrédito das instituições, a indiferença dos cidadãos pela política e o desinteresse pelas eleições revelam o deterioramento do convívio social.

A experiência da Amarribo no combate a corrupção municipal nasceu da constatação de que não adianta implementar projetos de desenvolvimento humano antes de neutralizar a ação daqueles que se dedicam ao desvio do dinheiro público.

Acreditamos que ao enfrentar a corrupção, criamos meios para acabar com a carência crônica de verbas que afeta milhares de municípios brasileiros. Além disso, a administração ética dos recursos públicos melhora a qualidade dos serviços básicos oferecidos a população, equilibra a circulação de recursos e possibilita a geração de novos empregos.

              Identifique

O primeiro passo para combater a corrupção é identificar o perfil do fraudador, suas práticas e comportamentos.

1. Reconheça o Sr. “Rouba, mas faz” – Perfil do corrupto brasileiro

Ele faz promessas eleitorais, mas depois da posse esquece tudo o que disse durante a campanha. O administrador corrupto utiliza o orçamento público para empregar amigos e parentes, favorecer aqueles que apoiaram durante o processo eleitoral e pagar antigas dívidas pessoais ou políticas com credores.

Eles usam o orçamento da prefeitura ou do órgão que dirigem como se fosse o seu pessoal, misturando os assunto e as prioridades, de forma a confundir os observadores, e assim conseguir utilizar os recursos públicos a seu favor, despertando menos suspeitas.

2. Observe a gestão de sua cidade. Desconfie quando…

  • O eleito e seus auxiliares têm histórico comprometedor
  • Falta transparência nos atos administrativos
  • Não existem controles administrativos ou financeiros
  • Há apoio ou conivência com grupos suspeitos de crimes e irregularidades
  • Os colaboradores tem baixo nível de capacitação técnica
  • A comunidade é excluída do processo orçamentário

 3. Fique atento a atitudes que denunciam: 

  • Sinais exteriores de riqueza: Quando o eleito, amigos e parentes exibem bens de alto valor, adquiridos de uma hora para outra, como carros, imóveis, jóias. Desconfie também quando o padrão de consumo não for compatível com a renda, como grandes viagens, festas ou despesas em bares e restaurantes.
  • Resistência a prestar contas: Se os administradores locais dificultam o acesso à informação, especialmente sobre os gastos da Prefeitura, desconfie. Por lei, todo cidadão tem direito a esse tipo de informação.
  • Falta crônica de verba: O orçamento da Prefeitura é calculado para cobrir os serviços básicos da cidade. Sinais de abandono ou negligência podem ser indicadores de má administração ou desvio de recurso público.
  • Parentes e amigos empregados: Uma dos artifícios mais utilizados para o pagamento de favores de campanha é a contratação de corregilionários, amigos e parentes no serviço público sem necessidade real.
  • Não divulgação dos gastos públicos: A Lei Orgânica do Município obriga o prefeito a divulgar diariamente o movimento do caixa do dia anterior. Ele também deve tornar público o balancete mensal da Prefeitura.
  • Transferências de verbas orçamentárias: Remanejamentos de grandes somas são suspeitos. Desconfie de transferências de verbas acima de 5%. O prefeito pode subverter todas as prioridades originais com grandes transferências entre as rubricas. Isso pode em algumas situações ser feito para atender necessidades emergenciais, mas na maioria das vezes é feita para atender interesses eleitorais e pessoais dos prefeitos. É preciso uma análise cuidadosa das transferências, e elas deveriam ser analisadas pela Câmara Municipal.
  • Perseguição a outros administradores honestos: Os corruptos tentam eliminar qualquer obstáculo ao seu esquema de enriquecimento ilícito. Um sinal de que há corrupção é quando há perseguição a administradores honestos.

 4. Conheça as práticas de corrupção frequentes:

  • Notas frias: De empresas que não existem juridicamente ou fisicamente.
  • Superfaturamento no preço: Compra de produtos e serviços com valor muito acima do praticado pelo mercado, em que a diferença entre o preço real e o superfaturado é repartida entre fornecedor e funcionários da prefeitura.
  • Superfaturamento na quantidade: São compras cuja a quantidade de produtos é muito superior à demanda real ou à entrega.
  • Licitações fraudulentas: O caso mais comum é forjar a participação de três concorrentes, utilizando documentos falsos de empresas legalmente constituídas. Outro esquema é combinar os valores superiores para garantir que determinada empresa irá ganhar a concorrência.

Todas essas estratégias exigem, sem excessão, a conivência de funcionários da prefeitura. A prática mostra que é impossível um prefeito roubar sozinho. Preste atenção nas atitudes dos responsáveis por compras, almoxarifado, recebimento de serviços prestados, contabilidade e tesouraria.

        Investigue

Os esquemas de corrupção possuem estratégias para camuflar irregularidades. Pequenos detalhes como o preenchimento de uma nota fiscal ou cheque escondem artifícios para dilapidar o patrimônio público. Investigue:

  • Fornecedores distantes e desconhecidos: Não utilizar os fornecedores locais é uma das técnicas para subtrair recursos públicos. A aquisição de material de empresas fora da cidade dificulta a investigação sobre as empresas.
  • Notas fiscais com descrição vaga sobre prestação de serviço: Ela deve conter informação clara sobre o serviço realizado, tempo gasto e material aplicado.
  • Empresas fornecedoras, constituídas no início e fim de mandato: O período de mudança de governo é propício para implantar esquemas de corrupção. Desconfie de empresas fornecedoras da prefeitura que são constituídas no início e fim de mandato. Elas podem ter sido especialmente criadas com o objetivo de desviar verbas públicas.
  • Pagamentos com cheques sem cruzamento: Para evitar o rastreamento dos recursos, funcionários corruptos facilitam as transações fraudulentas emitindo cheques de pagamento sem identificação do credor.
  • Notas fiscais com valores próximos a R$ 8 mil: Uma das maneiras de desviar verbas públicas é utilizar a Lei 8.666/93 que permite a contratação de serviços e compras até R$ 8 mil sem licitação. Verifique se não há emissão freqüente de notas fiscais nesta condição.
  • Licitações com condições que impedem a livre concorrência: Com freqüência, estes pré-requisitos privilegiam fornecedores “amigos”. Outros indícios que devem ser investigados são a freqüência com que as empresas ganham as licitações e a sua sede.
  • Licitações fraudulentas: Freqüentemente, a perícia em propostas apresentadas por três empresas “concorrentes” revelam que todas foram escritas no mesmo estilo, com trechos ou parágrafos semelhantes. É possível que o grupo tenha utilizado até a mesma máquina de escrever para datilografar as propostas.
  • Publicações oficiais: A negociação da compra de espaço em jornais locais pode envolver valores acima do mercado e manipulação da população com notícias tendenciosas.

Festas públicas: São uma oportunidade para justificar gastos excessivos, especialmente na compra de materiais para a produção do evento e cachês de artistas.

                 Reúna provas

Antes de denunciar o desvio de verba pública é necessário obter documentos que comprovem as suspeitas.

  • Verifique as denúncias cuidadosamente. Elas podem ser apenas desavenças políticas.
  • Busque informações em órgãos públicos como a Junta Comercial, Receita Estadual e Federal.
  • Identifique funcionários que colaboram com o esquema de corrupção.
  • Analise transferências e aplicações de recursos como o FUNDEF

No caso de empresas fantasmas, verifique:

Existência física: Vá ao local indicado na nota fiscal e veja se a empresa está realmente instalada. Certifique-se com moradores da região se a empresa já funcionou no local ou não. Se constatar que a empresa é fantasma, tire fotos do local. Elas são úteis para o processo.

Aspectos jurídicos:

  • Confira se a empresa tem certidão na Junta Comercial.
  • Confirme o seu Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) da Receita Federal
  • Além disso, confira todas as informações disponíveis pois existem empresas fantasmas que utilizam o número de empresas legalmente constituídas.
  • Verifique o seu cadastro na Receita Estadual, junto a Secretaria Estadual de Fazenda através do Sintegra.
  • Notas fiscais: Verifique se a gráfica que imprimiu o talonário da empresa funciona no local indicado. Existem gráficas clandestinas especializadas em fornecer talonários para esquemas de corrupção.
  • Serviços prestados: Verifique irregularidades como compras acima da demanda real, preços superfaturados ou descrição vaga sobre os serviços prestados.
  • Outro indício de corrupção são empresas que emitem notas apenas para a prefeitura.

 Denuncie

Tendo reunido provas consistentes de que existe corrupção na administração de sua cidade, é possível entrar em contato com os órgãos públicos competentes para investigar as denúncias. No entanto, é importante lembrar que:

  • Os fraudadores são pessoas sem escrúpulos que poderão forjar ou destruir documentos, subornar pessoas, intimidar testemunhas ou atacar a integridade daqueles que os denunciam. Por isso, é preciso planejar com antecedência todas as reações para possíveis ataques. Não se intimide. Responda as suas acusações com argumentos claros, apresente provas.
  • É indispensável  aprofundar os conhecimentos sobre a legislação brasileira antes de iniciar um processo. Geralmente, os envolvidos em esquemas de corrupção possuem bons advogados que exploram erros cometidos na formalização e tramitação do processo para tentar anular o inquérito.

 Veja a quem recorrer:  

Tribunal de Contas do Estado: Este órgão se limita a investigar os aspectos formais dos procedimentos e documentação. O seu relatório pode servir como prova para um eventual processo. Na Bahia, acesse www.tce.ba.gov.br