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ICMS: Campo de batalha que freia a economia nacional

PMVC

Qualquer que seja o lado ou segmento que se olhe no Brasil – área fiscal, desenvolvimento industrial, educação ou infraestrutura – observa-se gritante carência de políticas consistentes e duradouras. Isso projeta um cenário híbrido, opondo a moderna gestão empresarial, com suas ações estrategicamente guiadas por metas, prazos, avaliações e correções de rota, ao peso de um Estado anacrônico, burocrático e estacionado em suas conveniências e estruturas. Uma figura que cabe bem a essa situação é a do carro que anda com o freio de mão puxado. Assim permanece o Brasil, a despeito de todo o crescimento econômico registrado na primeira década deste século, em que a taxa de desemprego teve baixa recorde e a mobilidade social registrou avanços inimagináveis doze anos atrás.

Nação com relevante inserção no contexto geopolítico mundial na atualidade, o País, cuja taxa de desemprego fechou o mês de janeiro passado com 5,5%, a menor da série histórica do IBGE para o período, e que viu a pobreza absoluta cair de 17,3 para 7 milhões de pessoas em dez anos, convive com um dos piores índices de competitividade industrial da economia globalizada. Sob a pressão de uma carga tributária equivalente a 35% do Produto Interno Bruto (PIB), o empresário brasileiro está sucumbindo ao modus operandi nacional de se baixar regras ao sabor da ocasião e de interesses localizados ou pontuais, especialmente em nossa remendada legislação tributária.

Não há planejamento que sobreviva à mudança constante ou à indefinição das regras do jogo. Indústrias nascidas em solo nacional estão migrando para ambientes mais estáveis e favoráveis, como a Índia. Em médio prazo, vislumbra-se o grande risco de que os indicadores macroeconômicos que hoje recheiam o discurso otimista de nossas autoridades cedam lugar a um rosário de lamentos. Será tarde, pois deslocar um parque industrial não é algo tão simples como mudar de casa.

O caso do Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias (ICMS) é um dos mais emblemáticos de toda essa conjuntura, questão que entrou mesmo em terreno ardiloso e engendrou um verdadeiro campo de batalha entre os Estados, os quais tiveram de desenvolver todo um sistema de inteligência fiscal para flagrar burlas em arranjos estabelecidos entre contribuintes e demais entes federados. Conforme a Constituição Federal de 1988, Estados e Distrito federal têm autonomia para legislar em relação ao imposto, não somente sobre as alíquotas, mas também quanto ao momento de cobrá-lo, seja na entrada da mercadoria, na saída ou na extração da nota fiscal. Desde então, eles vêm baixando legislações e normas que lhes permitem tirar o melhor proveito possível desta que é a sua principal fonte de arrecadação. Uns prejudicando outros, desencadeando o enredo de conflitos que bate às portas do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).

Nesse aspecto, destacam-se três eventos bastante comuns e perniciosos à atividade produtiva.  O primeiro reside nos descontos que os Estados de destino das mercadorias, insumos e alguns serviços concedem às empresas fornecedoras, sem que o benefício esteja expresso de maneira transparente quando esta unidade federativa fecha as contas com o Estado de origem, para os repasses devidos. Tratam-se aqui dos mecanismos de crédito e de substituição tributária, dois bons exemplos quanto à complexa, confusa e imbricada “engenharia” em que se transformou a cobrança do ICMS.

No final, o empreendedor em dia com os tributos, ou seja, o contribuinte bem intencionado, acaba sofrendo sanções impostas pelos Estados de origem, a exemplo do que vem acontecendo no âmbito do governo de São Paulo. Em vez de o Estado buscar solução com as demais federações, recai sobre a parte mais fraca, o empresário que gera empregos. É o caso do programa Tolerância Zero, do governo paulista, que lavrou R$ 2,8 bilhões em autos de infração contra as empresas beneficiadas pelos Estados de destino, somente em janeiro passado. Em fevereiro, a sangria atingiu a R$ 3,4 bilhões.

O segundo evento que tem prejudicado a indústria diz respeito aos descontos que alguns estados estão oferecendo aos importadores, desde que estabeleçam uma representação local. Assim, mercadorias que chegam ao País, já bastante favorecidas pelo baixo custo em seus países de origem, ganham um plus sobre o preço do produto nacional ao encontrar grande desconto na alíquota do ICMS incidente sobre a transação. Há ainda o jogo com as diferenças nas alíquotas, em que indústrias migram de um Estado a outro em busca de vantagem, deixando para trás toda uma infraestrutura cara e parte de uma mão de obra já treinada e especializada. Não é estranho, desta forma, que São Paulo tenha perdido, em 15 anos, 29% das montadoras e indústrias de autopeças e agora observe movimento semelhante no parque frigorífico de carnes.

Além disso, micro, pequenas e médias empresas vivem um problema a parte, pois ao entrar em ação o mecanismo da substituição tributária, veem inócuos os efeitos do Simples Nacional. Originalmente tributados em 1,25% para efeitos de ICMS, esses empresários acabam tendo que recolher 18% pela Margem de Valor Agregado (MVA), problema que levou o Sescon-SP, a Fecomércio de São Paulo e a Fiesp, entidades que compõem o Fórum Permanente em Defesa do Empreendedor, a entregar ao governo paulista a primeira proposta entre os estados brasileiros para revisar a aplicação da substituição tributária para as MPEs.

Finalmente, no caso específico de São Paulo, ao invés de o governo encontrar uma solução política, vai atrás dos contribuintes bem intencionados, aplicando sansões e os prejudicando. É um enredo caro ao segmento produtivo e cujos reflexos negativos sobram, no final das contas, para o contribuinte. Pois nesse modus operandi cada um vai repassando seus custos ou perdas a outrem, criando novas regras ou simplesmente abandonando o jogo. É preciso defender o empreendedorismo e coibir a aplicação de sanções em quem gera empregos.

 José Maria Chapina Alcazar é empresário contábil e presidente do SESCON-SP – Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e de Assessoramento no Estado de São Paulo e da AESCON-SP – Associação das Empresas de Serviços Contábeis; presidente do Conselho de Assuntos Tributários da Fecomércio SP